Há um nome que dirá muito pouco a muitas pessoas. Esse nome é
Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, que ficou conhecido simplesmente
por Cabral Moncada. Nunca vi nenhuma fotografia sua. Diz a história, que foi
Governador-Geral da Província de Angola entre 1900 e 1903.
Foi numa rua com o seu nome, que nascia no lado este do Liceu
Salvador Correia de Sá, em Luanda, que vivi em criança.
Foi nessa rua que andava de triciclo, sempre acompanhado pela
minha irmã, que me vigiava e que mais tarde me ensinou a andar de bicicleta, na
praceta na zona fronteira ao Liceu.
Era uma rua só de moradias, algumas geminadas como aquela
onde vivemos poucos anos até partimos inesperadamente.
Eu tinha só 8 anos mas recordo-me perfeitamente como era
viver naquela rua, calma, onde todos se conheciam, pois as casas eram de
construção recente e receberam-nos para um futuro que acabou por ser curto.
Nunca ouvi dos meus pais nenhum lamento por termos embarcado
no navio Uíge em Luanda em Maio de 1961, deixando para trás tudo o que tinham
construído, inovando no ensino infantil e primário numa sociedade tão afastada
do desenvolvimento.
Fiquei no meu imaginário com a imagem daquela casa, onde
tirámos tantas fotografias, no jardim, nas escadas da entrada, nas traseiras
onde se faziam os lanches com os amigos e a pouca família que vivia em Luanda.
Lembro-me do interior, com os móveis, alguns desenhados pelo
meu pai, da árvore de Natal, no pino do calor, das escadas interiores onde por
vezes de noite me encontravam sentado, fruto do meu sonambulismo infantil.
Ainda hoje não consigo comer um abacate, sem me lembrar do
abacateiro do vizinho do lado que todos os dias nos presenteava com um abacate,
que caia dos ramos do nosso lado.
Estas memórias são distantes 53 anos de hoje, mas estão muito
vivas. Por vezes perguntam-me e eu próprio me questiono se não gostaria de
reviver Luanda. Não sei responder a essa dúvida. Por vezes a actualidade
desilude-nos. Poderá ser esse o meu receio.
Mas sem que nada o fizesse prever o presente veio ter comigo.
No passado mês de Julho, passados tantos anos, o improvável aconteceu.
Estava numa conversa com colegas de um projecto empresarial
que estamos a implementar, quando a não mais de três metros de mim ouvi alguém
falar na Rua Cabral Moncada.
Quando me aproximei estavam algumas pessoas a falar de Luanda
e das zonas que conheciam ou onde tinham vivido.
Mas eu só queria saber da Rua Cabral Moncada.
O impossível tinha sucedido. Uns familiares da colega moravam
agora na rua. No mesmo dia envie-lhe as fotos que identificavam a minha casa,
ou melhor a casa que tinha sido minha e agora era de alguém.
Passados uns dias recebi a confirmação. Não era só a mesma
rua mas a casa onde agora viviam o marido e o filho era a mesma. Iam enviar
umas fotografias actuais para confirmar.
Recebi hoje, 7 de Agosto de 2014, as fotos da casa. Os muros
foram alteados, a casa tem uma cor mais africana. As casas estão muito
alteradas, mas é natural, passaram-se 53 anos e muita coisa mudou em Luanda.
Uma coisa é certa, a casa está em boas mãos.
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